Mesquita de Córdoba, arte da Espanha islâmica (Al Andalus).
Prato sassânida. fotografei na Sackler Gallery, Washington, D.C., no setor da Rota da Seda.
Caminhão paquistanês (Fotografei no festival da Rota da Seda em Washington, DC, na Smithsonian Institution).
A Rota da Seda no imaginário europeu sobre o Oriente
Trecho de meu livro Entre mitos, utopias e razão: os relatos franceses sobre o Brasil (Porto Alegre: EdiPUCRS, 2a edição revisada e ampliada, 2010) no qual analiso o imaginário dos viajantes e faço referência à Rota da Seda:
“(…)
O imaginário europeu sobre o Oriente era influenciado também pelas histórias contadas sobre a milenar Rota da Seda, que mergulhava suas raízes na Antiguidade. A denominação de Rota da Seda data do século XIX e foi cunhada pelo explorador e geógrafo Ferdinand Von Richthofen, mas as inúmeras aventuras daqueles que palmilharam sua vasta extensão já eram conhecidas há muitos séculos. Por Rota da Seda entende-se não uma estrada única, mas uma ampla rede de caminhos, trilhas e oásis pelos quais transitaram, desde a Antiguidade e, intensamente durante toda a Idade Média, comerciantes, monges, militares e aventureiros. Motivados por interesses variados, os viajantes, em razão dos inúmeros encontros, foram responsáveis também por um fecundo intercâmbio de ideias e de crenças.
Os monges budistas chineses Fa Xi’an e Xuanzang percorreram o interior da Ásia e deixaram relatos de grande interesse para a pesquisa histórica. O primeiro viajou entre os anos de 399 e 414, e o segundo, entre 629 e 654. Em toda a extensão da Rota da Seda, circulavam, entre outros, budistas, taoístas, confucionistas, zoroastristas, cristãos nestorianos, hinduístas, judeus e, a partir do século VIII, com o início da grande expansão do Islã, também muçulmanos. Viajantes ocidentais, como Marco Polo, Rubruck e Del Carpine percorreram igualmente os caminhos da Rota da Seda e tiveram influência marcante na rica elaboração de imagens do Oriente na Europa com a divulgação de seus relatos
As grutas do oásis de Dunhuang, um importante testemunho material da religiosidade budista, ainda hoje são de grande interesse para os pesquisadores e visitantes que percorrem antigos caminhos em busca de traços do passado. Esse oásis era um ponto de descanso importante para mercadores e peregrinos que se deslocavam entre os extremos orientais e ocidentais da Ásia e entre o norte e o sul do continente. As grutas começaram a ser utilizadas no século III da era atual principalmente por monges chineses e indianos e por outros peregrinos vindos de diversas regiões do continente asiático.
Os religiosos budistas foram se estabelecendo em Dunhuang e formando comunidades que, por sua vez, passaram a receber novos visitantes na medida em que se tornavam mais conhecidas. As grutas mantiveram-se muito frequentadas durante toda a Idade Média especialmente até o século XVI, enquanto durou o período de maior importância da chamada Rota terrestre da Seda. Comerciantes cristãos também faziam de Dunhuang um de seus pontos de descanso e ali foram encontrados documentos que atestam a passagem de nestorianos e outros cristãos orientais.
Antes de seguir caminho, as caravanas encontravam no oásis de Dunhuang repouso, apoio material e conforto para o espírito, através dos ensinamentos dos monges budistas. Como era hábito na época, pediam a proteção para suas jornadas fazendo doações que, através dos anos, foram se concretizando como encomendas regulares de obras de arte. Enriqueciam-se, dessa forma, as paredes das cavernas com um impressionante conjunto de pinturas e esculturas.
No século XIV, problemas provocados pelos deslocamentos dos mongóis levaram ao desenvolvimento da rota marítima, em substituição ao inseguro caminho terrestre que era anteriormente realizado com frequência. Os navios passaram então a tomar a direção do Oceano Índico para chegar à distante China com escalas em diversos portos, o que permitia acrescentar muitos produtos às cargas além da tão procurada seda chinesa, da porcelana e do jade. Nesse percurso, multiplicavam-se não apenas os negócios, mas também as lendas e os contos fantásticos.
Quando, um pouco mais tarde, os navegantes percorrem novas rotas e avançam pelo Atlântico para contornar a África, estão presentes todos os componentes de um imaginário complexo que associa a viagem à aventura, aos lucros e ao maravilhoso.”